João Cardoso CEO Teleperformance Portugal e membro do Comité Executivo do grupo internacional com funções de I&D e de Integração Digital.
“É por fazerem tudo através da internet que as pessoas precisam de nós”
João Cardoso CEO Teleperformance Portugal em entrevista à Revista Exame.
As mudanças de turno nos centros de contacto (contact centers) da Teleperformance assemelham-se a um desfile de abertura de umas miniolimpíadas. Milhares de jovens, de 86 nacionalidades e 36 idiomas, cedem o lugar a outros que irão passar as próximas horas à distância de um telefonema ou de um clique no rato do computador para darem resposta às dúvidas e atenderem às reclamações dos consumidores dispersos pelo mundo. O modelo multilíngue, implantado em Portugal pela multinacional francesa, continua a ser alimentado por muita mão de obra estrangeira. Se recrutasse apenas dentro de portas, a empresa não teria escala e não haveria crescido tanto, admite João Cardoso CEO Teleperformance Portugal.
João Cardoso CEO Teleperformance Portugal está à frente desta empresa há 16 anos. O que se imagina a fazer nos próximos 16?
Sinto que hoje há muito mais para fazer do que alguma vez houve. O setor está a mudar radicalmente e continua a crescer. Todos os anos, a classe média aumenta em 160 milhões de pessoas a nível mundial. Essas passam a ter telemóveis e a necessitar de novos serviços. Então começam a aparecer as relações virtuais entre empresas e consumidores. Quando havia um problema, o cliente voltava à loja, os serviços estavam materializados fisicamente. Não existiam serviços virtuais. Hoje, isso acontece cada vez menos. O comércio eletrónico está a disparar – na China, 30% do comércio é eletrónico; no Reino Unido, ronda os 16%-17% –, e as pessoas também procuram apoio de forma remota, o que torna os nossos serviços ainda mais necessários. Outra mudança é a migração do modelo de aquisição para o modelo de subscrição. Em vez de comprar um carro, o cliente faz uma subscrição de um serviço de partilha de viaturas. Em vez de comprar um CD, subscreve um serviço de streaming. Agora, as empresas de streaming de vídeo ou de música necessitam de prestar um serviço de excelência para reterem o cliente. Estamos a assistir a uma revolução de milhares de milhões de euros neste modelo das subscrições, que necessita muito mais dos nossos serviços do que o anterior modelo das aquisições.
A massificação da internet e o aparecimento de novos serviços aumentaram o negócio dos centros de contacto?
Dizia-se que, com a internet, este setor iria encolher, mas tem ocorrido o contrário. É por fazerem tudo através da internet que as pessoas precisam de nós. Temos vários fatores que se conjugam: mais consumidores fazem mais aquisições e mais subscrições online, provocando uma explosão do número de interações entre os clientes e as empresas. E as empresas precisam cada vez mais de soluções de Inteligência Artificial, porque não têm outra forma de dar resposta a este fenómeno.
Como tem dado resposta às novas necessidades dos clientes?
Apostámos nas soluções digitais. Desenvolvemos competências ao nível da Inteligência Artificial e da robotic process automation, identificando processos repetitivos e conseguindo robotizá-los. As tarefas repetitivas, que não acrescentam valor e que até são frustrantes para as pessoas, tornam o trabalho mais agradável e mais produtivo quando são automatizadas. Anualmente, o grupo investe cerca de 150 milhões de euros em tecnologia. Cada uma das subsidiárias beneficia desse investimento. No ano passado, adquirimos por mil milhões de euros a Intelenet, na Índia, com o objetivo de acelerar competências no domínio da automação.
O negócio dos centros de contacto vai crescer até quando? Qual é a previsão?
Esta empresa cresce continuamente há 16 anos, a uma taxa média de 33% ao ano. Tivemos alturas em que crescemos 50 por cento. Se a Teleperformance Portugal continuasse a este ritmo, teríamos 450 mil funcionários dentro de 15 anos. Mas acho que isso não vai acontecer, senão toda a população da Terra estaria a trabalhar na Teleperformance daqui a uns 40 anos [risos].
Como conseguiu crescer nos anos de crise?
Nunca tivemos qualquer ano de crise. Crescemos anualmente, no mínimo, 20 por cento. A apetência por estes serviços sempre foi muito grande e não havia ninguém a prestá-los.
O que distingue os vossos serviços do resto do mercado?
Em 2003, quando fomos adquiridos pela Teleperformance, tínhamos 200 pessoas, um centro de contacto em Lisboa, e fazíamos essencialmente televendas. Nesse ano, lançámos um projeto mais orientado para o serviço ao cliente (customer service) e conquistámos bastantes contas. Em 2004, achei interessante desenvolver um modelo que servisse vários países a partir de Portugal. Na altura, era um conceito bastante inovador. O grupo era o terceiro maior a nível mundial (hoje é líder), mas a empresa portuguesa era pequena. Cada subsidiária do grupo trabalhava para o seu mercado e desenvolvia soluções offshore, tirando partido do diferencial de custos. O mercado norte-americano era servido a partir da Índia, o mercado francês a partir da Tunísia e o mercado espanhol a partir da Argentina, e, mais tarde, de outros países. O modelo multilíngue pareceu-me interessante, porque começava a haver maior mobilidade de pessoas na União Europeia (UE) e maior recetividade das empresas para considerarem a centralização dos serviços.
Quais eram as vantagens de Portugal?
Não pensei muito nisso. Estava a gerir a empresa portuguesa [risos]. Os custos das telecomunicações tinham reduzido muito, e isso viabilizava a prestação de serviços a partir de outros países. Havia também vantagens na centralização. Uma organização que tenha pequenos centros de apoio ao cliente espalhados pela Europa, geridos de forma separada, cada um com as suas áreas de TI, formação, recrutamento, ganha muito mais juntando tudo e começando a prestar o serviço a partir de países com custos razoavelmente elevados. Pareceu-me que isso fazia sentido. Não conseguiríamos trazer para cá uma grande marca, porque o grupo não nos deixaria correr esse risco, mas existiam clientes que poderíamos abordar para uma solução desse tipo.
Foi difícil convencer a casa-mãe em França quanto aos benefícios de um modelo multilíngue em Portugal?
Não houve barreiras nem uma motivação grande. Não houve sequer discussão. As subsidiárias tinham bastante autonomia. Para nós, o ponto crítico foi a criação de um modelo que fosse escalável, mas esse era um dos grandes argumentos contra este modelo. Funcionava com 60 pessoas num centro de contacto, mas não se sabia se este iria funcionar com 600. No entanto, demonstrámos que o modelo é escalável. Temos mais de 6 mil pessoas nos nossos centros multilíngue e não estamos no limite.
“O modelo das subscrições precisa muito dos nossos serviços do que o anterior modelo das aquisições”
João Cardoso CEO Teleperformance Portugal
Quais foram os primeiros clientes a testarem o novo modelo?
Começámos com um cliente na área da logística, que procurava soluções inovadoras de centros de contacto. Para eles, também foi um risco. Não tínhamos negócios em línguas estrangeiras e não conseguíamos demonstrar, à partida, que iríamos capturar talento para executar o modelo. O serviço prestado a esse primeiro cliente tinha 60 pessoas, divididas por 12 línguas. Os grupos maiores eram o francês, o alemão, o inglês e o italiano.
Teve de recrutar não residentes?
Os grupos de francês e de inglês foram feitos com portugueses. Os de alemão e de italiano foram feitos com portugueses e com estrangeiros que já viviam em Portugal. Fora do País, contratámos um finlandês, um sueco e um flamengo. Depois de termos demonstrado que era possível, tornou-se tudo mais fácil e, a seguir, captámos duas empresas do setor automóvel.
O modelo testado em Portugal foi adotado por outras subsidiárias?
Sim. Entre 2006 e 2007, o grupo entendeu que o modelo tinha um potencial muito grande e, a partir de então, lançámos um programa de estabelecimento noutras subsidiárias. A apetência do mercado por este tipo de soluções era já enorme.
Porquê? Qual era a maior vantagem? Custos mais baixos para os clientes?
Ao centralizar vários centros, mesmo num país como a Alemanha, há uma redução enorme de custos, mas essa não é a única vantagem. O maior benefício é a agilidade. Trabalhamos com organizações que têm de atuar muito rapidamente, quando há uma alteração de processo ou um novo produto, e nós conseguimos ser mais ágeis porque centralizamos a atividade. Temos tempos de reação de menos de um dia para coisas que se fariam em três ou quatro semanas. Além disso, o nosso know-how é incomparável, a capacidade de atrair talento é tremenda e a de atrair negócio é ainda maior, porque temos marcas da Fortune 500. Se isto não funcionasse, elas não estavam connosco. Sempre que um cliente nos visita, ganhamos o negócio. O modelo é tão interessante, está tão demonstrado e temos marcas tão fortes que somos imbatíveis. Posicionámo-nos no modelo multilíngue muito cedo, tivemos tempo para crescer e construímos uma posição forte. Hoje já não é assim, não há tanto tempo para crescer.
Quando começou a recrutar mão de obra fora de Portugal?
Desde o início que sempre considerei recrutar fora de Portugal e ter uma oferta que fosse atrativa para as pessoas. Sem isso, não haveria escalabilidade. Se estivéssemos dependentes do recrutamento em Portugal, iríamos bater num teto.
Foi difícil recrutar no estrangeiro?
Somos líderes mundiais nesta área de customer service, hoje business service, que é das que mais crescem. Há um potencial de carreira único. Tenho colegas que começaram a trabalhar há 6 ou 7 anos e que hoje gerem equipas com milhares de pessoas. São poucas as empresas em que poderiam ter feito este percurso. A carreira é o primeiro fator de atração de talento. À volta disso, trabalhamos a cultura de empresa e o espírito de inclusão. Há nove anos que somos uma das melhores empresas para trabalhar, nomeadamente no ranking da revista EXAME. Isto funciona como um cartão de visita para uma pessoa que está na Alemanha. Outro aspeto é a equipa. Temos pessoas de 86 nacionalidades, que falam 36 línguas tão diversas como o farsi, japonês, malaio ou africâner. É muito atrativo para quem quer fazer carreira noutro país.
Especialmente para os muito jovens?
A idade média dos nossos colaboradores é 27 anos. São jovens, mas não acabaram propriamente de sair da faculdade. Já trazem uma experiência de trabalho.
São uma empresa que está permanentemente a recrutar?
Até agora sim, porque temos estado sempre a crescer. O crescimento permite-nos atrair talento e oferecer uma carreira às pessoas. Além disso, Portugal é um país interessante para se viver.
Quando o destino Portugal começou a ajudar ao recrutamento?
Em 2003 ou 2004, Portugal ainda não estava na moda. Era um País de que as pessoas ouviam falar, mas ainda não o tinham visitado. Tinha um certo exotismo de destino desconhecido. Criámos o conceito Atlantic Experience, que ainda hoje utilizamos, para apelar ao imaginário de quem vive na Europa Central. Juntámos carreira, empresa, multiculturalidade e País. Trabalhamos também para remover todas as barreiras à mudança. A maior de todas é o alojamento. Somos nós que tratamos disso, mas também das viagens, da segurança social, do número fiscal, do documento de residência…
Hoje é dificílimo arranjar alojamento em Lisboa. Como consegue?
Criámos uma rede de proprietários que nos permite alojar cerca de 4 600 pessoas em 1 400 apartamentos arrendados. Muitos colaboradores arranjam depois a própria casa.
A subida das rendas aumentou os custos?
Houve uma subida, mas os proprietários reconhecem-nos como um parceiro muito estável que lhes assegura, além da renda, uma baixa rotação, porque mantemos a ocupação por largos períodos de tempo. Os proprietários que há 16 anos começaram a trabalhar connosco ainda continuam connosco.
Qual é o tempo médio de permanência dos não residentes?
É próximo dos três anos. Tentamos atrair pessoas durante períodos longos, mas um dos aspetos do nosso negócio é o apoio aos clientes em períodos de pico. Cerca de um terço são empresas de e-commerce, com grandes flutuações de negócio, nomeadamente no período do Natal. Para termos capacidade para esses picos, trazemos pessoas por períodos mais curtos, que depois podem migrar para outros programas. Este modelo funciona, porque temos estado sempre a crescer.
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